sábado, 17 de setembro de 2011

O porquinho do Peru


O animal de asas aterrissou. Era bem maior que aquele acariciado embaixo de sua blusa de moletom, escondido cuidadosamente. Despistou os seguranças antes de partir só para levá-lo. Não poderia simplesmente deixá-lo em uma gaiola. Era seu querido Ted. Não apenas amigo, um companheiro.

Foi assim desde que o ganhou de sua mãe em seu aniversário de sete anos. Ela havia prometido um bichinho. Achou que o presente seria um cachorro. Quando o viu de pronto, estranhou, não sabia o que era. Parecia uma mistura de rato com castor. Mas depois que notou aqueles grandes olhos e o formato arredondado de seu corpo ficou encantada. Cabia em sua mão. Fofinho demais.

Andando pelo aeroporto, observava os diferentes traços faciais e vestimentas. Lima era desconhecida por todos da família, mas estavam entusiasmados com o novo lar. Seu pai havia sido transferido a trabalho para a cidade e a esposa e sua filha pequena – a dona do porquinho - o acompanharam na trajetória.

Chegando ao estacionamento, o pai assoviou para um táxi. Indicou no papel o endereço desejado.

- Bueno – disse o motorista colocando a primeira marcha.

No decorrer do percurso a garota observou vários pôsteres de animais parecidos com o seu pelos comércios das ruas. Falou baixinho:

- Olha que legal, Ted! O pessoal adora os porquinhos aqui! – o animal lambeu seu dedo em contentamento.

Chegaram à casa da hospedeira. Tia Francisca os instalaria até que encontrassem moradia própria. Na sala principal móveis de madeira e panos bem coloridos compunham o cenário. Era tudo muito diferente de seu apartamento cinzento e minúsculo em São Paulo.

- Buenos dias – cumprimentou a tia, abraçando o pai da garota com força.

- Por Dios, que alegria! Trouxeram um presente pra mim! – Falou a peruana, olhando animada para o animal e puxando-o da menina. – Que macio! - disse, acariciando-lhe. - Ficará delicioso com um pouquinho de pimenta e alecrim! – Ted tremeu.

Cozido de porquinho da índia no Peru era comum. Os restaurantes o serviam de diversas maneiras; era bastante procurado.

A filha arregalou os olhos e, espumando, arrancou-lhe da assassina de bichinhos de estimação. Correu pela casa apressada, fugindo. Francisca a perseguiu.

A mãe se jogou contra a homicida latina, mas esta se desvencilhou do golpe frustrado.

- Volte aqui, niña! – falou a aniquiladora, tentando acelerar com seus chinelos de pano pelo corredor. Não viu o pé de seu sobrinho semilevantado. Tropeçou e caiu batendo a cabeça na parede. Desmaiou. Ele riu, vitorioso.

A filha aproveitou o deslize e ganhou mais vantagem. Passou pela cozinha e viu a panela com água fervente. No balcão próximo havia um pedaço grande de carne. Deduziu ser frango. Não pensou duas vezes. Jogou-o na panela.

Já reanimada do acidente, Francisca, confusa, perguntou aos visitantes:

- Onde está aquele delicioso porquinho da índia?

- Porquinho? – responderam os três em uníssono. – Você bateu a cabeça muito forte hein, Francisca? – falaram rindo, enquanto a garota escondia Ted atrás das costas.


Polandesamente falando: o parentesco é ignorado pelo distinto costume não-aceito, quando o que mais importa é o proteger.

3 comentários:

  1. Proteger um animal, por mais que seja diferente, é uma lição de afeto.

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  2. Concordo com você, Rogério. Ainda mais quando o animal em questão é mais parte da família quanto alguns parentes, rs.

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  3. Ler sua historia foi divertido, mas melhor ainda é saber que tenho uma sobrinha escritora.
    beijos te amo

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