O biscoito da sorte se sentia azarado. Pensava alto consigo
na prateleira do supermercado “como pode um sortudo de nascença ter tanto azar?”.
A madrugada já avançava e não deveria haver barulho, segundo o ursinho Yumi Yumi,
três bolachas à esquerda, que reclamou:
- Shiiiiii! – disse baixinho tentando abafar a chatice do
docinho.
Ele não ouviu e continuo seu resmungo:
- O que eu faço agora? Não posso mais viver assim desse
jeito sem saber a verd...
- Oxente! – disse o urso com seu sotaque arretado de uma
fábrica de Natal – Viver assim como, ô rapaz? Não é hora de questionar a p*% da
sua existência, fique quieto, sim?
- Desculpe – lamentou o chorão, fazendo jus ao adjetivo e
soltando algumas gotas.
Sabendo que não adiantaria mais reclamar para o ser deixá-lo
em sono profundo, o ursinho foi até ele.
- Certo, me conta, quem sabe assim você me deixa em paz. O
que aconteceu?
- Eu descobri que tem um destino dentro de mim!
- Des... o quê?
- Um destino em forma de papel dentro do meu estômago!
- Ah, jura!? Você é um biscoito da sorte, por que será que
tem? – ironizou.
Ignorando a gracinha, continuou sua lamúria:
- Eu preciso descobrir o que é! Me ajuda, por favor!?
- Tá, tá, mas depois você me deixa em paz. E canta pra eu dormir
por três noites seguidas.
- Combinado.
- E o que eu tenho que fazer? – Perguntou o Yumi Yumi
- Puxe o papel do meu estômago. Sem me machucar,
acrescentou.
- Mas tudo parece a mesma coisa, como vou saber onde fica
seu estômago?
- Deixa o estômago pra lá, tem um acesso mais fácil perto da
minha cabeça. Tá vendo a parte branca aqui em cima?
- Sim.
- Então, sobe aqui e puxa.
O ursinho parou e pensou por alguns segundos. Notou que o
biscoito era pelo menos quatro vezes mais alto então pular não adiantaria.
Olhou para a firmeza de seus contornos e decidiu.
- Vou te escalar. Não se mexe.
Com muito esforço por conta de seu sobrepeso, o bichinho de
gelatina subiu, e subiu, e subiu, até que finalmente, quase sem sua orelha pelo
açúcar ter derretido com o suor, chegou lá em cima. Alegre por poder finalmente
descobrir o que a vida lhe traria de missão, seu momento de entusiasmo foi
cortado pelo pequeno ajudante:
- Ih, rapaz, meus braços são muito curtos – se matando de
rir.
- Ah, não! – soluçando e lamentando – O que faço agora?
- Precisamos de alguém beeeeem comprido – siga-me.
Sem saber para onde ia o biscoito, estava apreensivo. Nunca
tinha saído do quarto andar, o corredor “G”, como carinhosamente chamava o
cantinho das guloseimas. Não tinha outra opção senão confiar naquela gelatina
de quatro patas.
Imaginando estar em uma floresta passou por galhos enormes até
chegar a um mais claro.
- Te apresento o salsão – disse o quadrúpede calórico.
- Encantado – respondeu a hortaliça fazendo uma enorme
reverência.
- O prazer é meu, senhor.
- Tá, tá, chega de carinho e vamos terminar logo com isso.
O biscoito respirou fundo e se preparou para a dor. Sentiu
os braços gelados pelo seu corpo. O
salsão segurou fortemente com uma das mãos sua cintura e direcionou a outra para
perto de sua cabeça. Avistou o papelzinho branco e puxou. Entregou para seu dono.
Segurando o maior tesouro de sua vida, trêmulo, leu:
- “O seu destino está em outro biscoito. Passe a vida
procurando”.
Polandesamente falando: o seu destino está em você, se
acreditar que ele é real e alcançável (ou só para quem tem braços compridos).
tadinho
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