terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Salada de glicose se faz com aventura



 

O biscoito da sorte se sentia azarado. Pensava alto consigo na prateleira do supermercado “como pode um sortudo de nascença ter tanto azar?”. A madrugada já avançava e não deveria haver barulho, segundo o ursinho Yumi Yumi, três bolachas à esquerda, que reclamou:

- Shiiiiii! – disse baixinho tentando abafar a chatice do docinho.

Ele não ouviu e continuo seu resmungo:

- O que eu faço agora? Não posso mais viver assim desse jeito sem saber a verd...

- Oxente! – disse o urso com seu sotaque arretado de uma fábrica de Natal – Viver assim como, ô rapaz? Não é hora de questionar a p*% da sua existência, fique quieto, sim?

- Desculpe – lamentou o chorão, fazendo jus ao adjetivo e soltando algumas gotas.

Sabendo que não adiantaria mais reclamar para o ser deixá-lo em sono profundo, o ursinho foi até ele.

- Certo, me conta, quem sabe assim você me deixa em paz. O que aconteceu?

- Eu descobri que tem um destino dentro de mim!

- Des... o quê?

- Um destino em forma de papel dentro do meu estômago!

- Ah, jura!? Você é um biscoito da sorte, por que será que tem? – ironizou.

Ignorando a gracinha, continuou sua lamúria:

- Eu preciso descobrir o que é! Me ajuda, por favor!?

- Tá, tá, mas depois você me deixa em paz. E canta pra eu dormir por três noites seguidas.

- Combinado.

- E o que eu tenho que fazer? – Perguntou o Yumi Yumi

- Puxe o papel do meu estômago. Sem me machucar, acrescentou.

- Mas tudo parece a mesma coisa, como vou saber onde fica seu estômago?

- Deixa o estômago pra lá, tem um acesso mais fácil perto da minha cabeça. Tá vendo a parte branca aqui em cima?

- Sim.

- Então, sobe aqui e puxa.

O ursinho parou e pensou por alguns segundos. Notou que o biscoito era pelo menos quatro vezes mais alto então pular não adiantaria. Olhou para a firmeza de seus contornos e decidiu.

- Vou te escalar. Não se mexe.

Com muito esforço por conta de seu sobrepeso, o bichinho de gelatina subiu, e subiu, e subiu, até que finalmente, quase sem sua orelha pelo açúcar ter derretido com o suor, chegou lá em cima. Alegre por poder finalmente descobrir o que a vida lhe traria de missão, seu momento de entusiasmo foi cortado pelo pequeno ajudante:

- Ih, rapaz, meus braços são muito curtos – se matando de rir.

- Ah, não! – soluçando e lamentando – O que faço agora?

- Precisamos de alguém beeeeem comprido – siga-me.

Sem saber para onde ia o biscoito, estava apreensivo. Nunca tinha saído do quarto andar, o corredor “G”, como carinhosamente chamava o cantinho das guloseimas. Não tinha outra opção senão confiar naquela gelatina de quatro patas.

Imaginando estar em uma floresta passou por galhos enormes até chegar a um mais claro.

- Te apresento o salsão – disse o quadrúpede calórico.

- Encantado – respondeu a hortaliça fazendo uma enorme reverência.

- O prazer é meu, senhor.

- Tá, tá, chega de carinho e vamos terminar logo com isso.

O biscoito respirou fundo e se preparou para a dor. Sentiu os braços gelados pelo seu corpo.  O salsão segurou fortemente com uma das mãos sua cintura e direcionou a outra para perto de sua cabeça. Avistou o papelzinho branco e puxou.  Entregou para seu dono.

Segurando o maior tesouro de sua vida, trêmulo, leu:

- “O seu destino está em outro biscoito. Passe a vida procurando”.

 
Polandesamente falando: o seu destino está em você, se acreditar que ele é real e alcançável (ou só para quem tem braços compridos).

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